Disparada- Geraldo Vandré (1966)

Uma música icônica e cheia de camadas interpretativas.

“Disparada” é uma música emblemática da música popular brasileira, composta por Geraldo Vandré em parceria com Théo de Barros. Lançada em 1966, a canção se destacou no II Festival de Música Popular Brasileira da TV Record, onde foi interpretada por Jair Rodrigues, empatando em primeiro lugar com “A Banda” de Chico Buarque.

A música é uma ode às injustiças e dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores rurais no Brasil. Com uma letra poderosa e comprometida socialmente, Vandré retrata a vida sofrida dos vaqueiros e camponeses, utilizando metáforas e uma linguagem poética rica em imagens da vida no campo. A melodia, fortemente influenciada pelo folclore e ritmos do nordeste brasileiro, complementa a força da mensagem.

O contexto histórico da época era bastante conturbado, com o Brasil sob o regime militar iniciado em 1964. Vandré era conhecido por suas canções de protesto e pelo enfrentamento ao regime, o que tornava suas composições ainda mais relevantes e impactantes.

“Disparada” se tornou um hino de resistência e justiça social, permanecendo até hoje como uma referência importante na música de protesto brasileira.

“Disparada” oferece várias camadas de interpretação, resilientes em seu significado social e cultural:

1. Crítica Social e Protesto: A letra retrata a vida dura dos trabalhadores rurais, refletindo as injustiças e desigualdades sociais enfrentadas pelos vaqueiros e camponeses. A música pode ser vista como uma crítica ao sistema opressor que explorava esses trabalhadores, dando voz à luta por direitos e melhores condições de vida.
2. Metáfora da Vida e Liberdade: Utilizando a figura do vaqueiro e seu cavalo, a canção simboliza a busca por liberdade e dignidade. A “disparada” pode ser interpretada como um rompimento com as correntes da opressão, uma corrida em direção à emancipação pessoal e coletiva.
3. Resistência Durante o Regime Militar: Lançada em um período de forte repressão política pelo regime militar brasileiro, “Disparada” também é vista como uma forma de resistência cultural. O sucesso no festival demonstrou o poder da música como forma de mobilização e conscientização social.

De forma ampla, “Disparada” continua sendo uma canção poderosa para a reflexão sobre justiça, igualdade e identidade cultural no Brasil.

Letra:

Prepare o seu coração
Pras coisas que eu vou contar
Eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão
Eu venho lá do sertão
E posso não lhe agradar

Aprendi a dizer não
Ver a morte sem chorar
E a morte, o destino, tudo
E a morte, o destino, tudo
Estava fora do lugar
E eu vivo pra consertar

Na boiada já fui boi, mas um dia me montei
Não por um motivo meu
Ou de quem comigo houvesse
Que qualquer querer tivesse
Porém por necessidade
Do dono de uma boiada
Cujo vaqueiro morreu

Boiadeiro muito tempo
Laço firme, braço forte
Muito gado e muita gente
Pela vida segurei
Seguia como num sonho
Que boiadeiro, era um rei

Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E nos sonhos que fui sonhando
As visões se clareando
As visões se clareando
Até que um dia acordei

Então não pude seguir
Valente lugar-tenente
De dono de gado e gente
Porque gado a gente marca
Tange, ferra, engorda e mata
Mas com gente é diferente

Se você não concordar
Não posso me desculpar
Não canto pra enganar
Vou pegar minha viola
Vou deixar você de lado
Vou cantar noutro lugar

Na boiada já fui boi
Boiadeiro já fui rei
Não por mim nem por ninguém
Que junto comigo houvesse
Que quisesse o que pudesse
Por qualquer coisa de seu
Por qualquer coisa de seu
Querer mais longe que eu

Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E já que um dia montei
Agora sou cavaleiro
Laço firme, braço forte
De um reino que não tem rei

Na boiada já fui boi
Boiadeiro já fui rei
Não por mim nem por ninguém
Que junto comigo houvesse
Que quisesse o que pudesse
Por qualquer coisa de seu
Por qualquer coisa de seu
Querer mais longe que eu

Mas o mundo foi rodando
Nas patas do meu cavalo
E já que um dia montei
Agora sou cavaleiro
Laço firme, braço forte
De um reino que não tem rei

Sobre o autor:

Geraldo Vandré, nascido Geraldo Pedrosa de Araújo Dias em 12 de setembro de 1935, em João Pessoa, Paraíba, é um cantor e compositor brasileiro que se destacou pelas suas canções de protesto e pelo seu papel na música popular brasileira durante os anos 1960.

Vandré mudou-se para o Rio de Janeiro, onde estudou Direito, mas acabou se dedicando à música. Nos anos de 1960, ele começou a ganhar reconhecimento nos festivais de música, um cenário que se tornaria palco para sua ascensão como uma voz de resistência e protesto social.

Uma de suas obras mais icônicas é “Pra Não Dizer que Não Falei das Flores” (também conhecida como “Caminhando”), lançada em 1968. Esta canção se tornou um hino contra a ditadura militar no Brasil, refletindo o espírito de resistência da época. A letra foi considerada subversiva pelo regime, e Vandré enfrentou censura e perseguição política, levando-o ao exílio em 1968, primeiro no Chile e nação em seguida, na França.

Além de “Disparada” e “Pra Não Dizer que Não Falei das Flores”, outras obras notáveis de sua carreira incluem “Canção Nordestina” e “Pequeno Concerto que Virou Canção”. Suas músicas são marcadas por uma profunda preocupação social, uma estética poética e uma influência de ritmos regionais brasileiros.

Após retornar ao Brasil na década de 1970, Vandré optou por um afastamento gradual da vida pública e artística, mantendo-se recluso e discreto. Seu legado, no entanto, permanece significativo, simbolizando a luta pela justiça e liberdade através da música.

Em entrevistas e declarações esporádicas, ele expressou o desejo de viver longe da fama e do estrelato, focando em sua paz pessoal. Como ele ainda vive em um ambiente reservado e não dá muitas entrevistas, as informações sobre sua vida atual são limitadas.